RD Entrevista – Zequinha Araújo, de campeão de votos ao amargor da derrota



Texto.: 
Vinicius Canova
Fotos.: Gregory Rodriguez

Porto Velho, RO – Ele construiu e consolidou sua carreira na política usando o mote social como principal bandeira. Desde os primórdios encampou batalhas pelas pessoas mais carentes dedicando-se a ações beneficentes em frentes variadas de atuação. José Francisco de Araújo, o vereador Zequinha Araújo (PMDB), é reconhecido por erigir e fomentar a associação homônima que hoje atende, segundo o próprio, mais de 20 mil pessoas.

Embora não se considere um político assistencialista, Araújo admite que, sem associação, não teria existido o homem que, outrora, fora denominado por órgãos da imprensa regional como um verdadeiro campeão de votos, praticamente imbatível.

Essa reputação, inclusive, só foi colocada à prova quando, pela primeira e única vez até hoje, sofreu revés nas urnas. Em 2014, ao disputar reeleição a deputado estadual após o peso de ter sido acusado de envolvimento na Operação Termópilas sob suspeita de receber propina de um assessor ligado ao ex-presidente da Assembleia Legislativa Valter Araújo, sentiu a solidão e o amargor da derrota. Em 2016, foi eleito novamente regressando este ano à Câmara Municipal de Porto Velho.

O peemedebista detalha sua versão, pela primeira vez, sobre duas acusações distintas a respeito de recebimento de propina.

Em ambos os casos o dinheiro supostamente ilícito teria sido escondido em peças de roupa. A primeira, na cueca; a segunda, em uma das meias. 

E ainda:

A nova Câmara de Vereadores e as impressões sobre o presidente Maurício Carvalho (PSDB); a mágoa com o governador Confúcio Moura (PMDB); as lágrimas derramadas ao relembrar traição familiar e a provação político-interna proposta pelo ex-prefeito José Guedes (PSDB) para que fosse candidato pela primeira vez.



"Não tenho malícia nenhuma!", exclama o experiente Zequinha / Foto.: Gregory Rodriguez (Rondônia Dinâmica)

Perfil e trajetória

O economista José Francisco Araújo nasceu no dia 29 de janeiro de 1957 em Ji-Paraná, Rondônia. Aos 60 anos, é casado e tem duas filhas. Zequinha Araújo, como é conhecido popularmente, é vereador por Porto Velho pela 6ª vez – o único do Estado a conseguir cinco mandatos consecutivos na Câmara; foi deputado estadual por Rondônia de 2011 a 2014. Reconhecido pela  associação beneficente que leva o seu nome.






Rondônia Dinâmica – Quem é Zequinha Araújo?

Zequinha Araújo – Satisfação, meu amigo. É um prazer prestar essas informações pra vocês. Eu gostaria de iniciar dizendo que o Zequinha Araújo, esse 'caboquinho', nasceu no seringal. Sou filho de soldado da borracha, nasci em 1957, no Seringal Anari. Hoje é o Vale do Anari, o município. Até meus dez anos de idade vivi na mata, dentro do seringal, aprendendo a cortar seringa e começando a trabalhar na profissão do meu pai. Quando saímos de lá, fomos para o Seringal 70. Foram mais dois anos no Seringal 70, do Aldemir Cantanhede, muito conhecido aqui naquela época. Saímos de lá e, depois, fomos trabalhar com o senhor Walter Bártolo, que trabalhava na firma que fazia a BR-364, naquela época BR-29, isso em 1964, 1968 por aí.

RD – E como foi sair do local de criação?

ZA – Olha, naquela época saímos de lá, criamos uma colônia, meu pai foi ser caseiro dele [Bártolo] e passamos dois anos por lá. Conseguimos um lote de terras e estabelecemos nossa propriedade onde fiquei até meus 20 anos trabalhando na roça, fazendo carvão, plantando arroz. Na juquira, na juquira... Mas naquela época, com dez anos, não sabia nem escrever meu nome. Aos 13, 14 anos terminei a 4ª série. Dentro da mata não havia como prosperar, continuar. Fiz o Primeiro Grau através do Instituto Universal Brasileiro, mandava correspondência para São Paulo e chegavam os livros. Eu enviava respostas de avaliações para São Paulo, enfim, foi muito difícil, mas consegui terminar o Primeiro Grau assim. Depois continuei, aos 17 anos, aliás, com 13 já havia começado a fazer ações  sociais. Percebi com essa idade que eu tinha essa habilidade em fazer trabalho social.

RD – E aí passou a dedicar-se às pessoas?

ZA – Sim. Fiz esse trabalho no programa nacional chamado Mobral [Movimento Brasileiro de Alfabetização]. Aos 13 anos, fui monitor do Mobral para 30 velhinhos, idosos, pessoas que não sabiam ler. Eles chegavam à minha casa pedindo para que eu lesse correspondências que chegavam do Ceará, de Alagoas, enfim, de todo o Nordeste. Aí falavam: “E agora o senhor pode me ‘arrespostar’?” E eu: “Claro, eu ‘arresposto’ para o senhor!” [risos]. Então escrevia para eles e as correspondências eram devidamente respondidas. Percebia muitas dificuldades com eles. Quando apareceu o programa, o Mobral, resolvi fazer parte e terminei tirando muita gente do analfabetismo. Foi muito proveitoso, a partir daí aflorou uma sensibilidade muito maior em mim. A gente percebeu que a solidariedade é um meio muito eficaz para se ajudar o próximo. Nunca mais parei.

RD – O que ocorreu a seguir?

ZA – Depois daquilo nós conseguimos fazer uma comunidade lá. Fizemos uma escola com ajuda do Lions Club, que nos auxiliou com material. Fizemos um mutirão. Aos 16 anos, com uma escola montada que nós ajudamos a fazer, comecei a lecionar para as crianças de lá. Eu já havia feito o Primeiro Grau no Instituto Universal Brasileiro e, logo em seguida, apareceu outro projeto, este chamado Logos 2 [cujo objetivo era formar, em regime emergencial, professores leigos], que aperfeiçoava e dava condições para que a pessoa se tornasse professor do Ensino Primário. Fui professor naquela época. Essa escola, a história em si e o funcionamento, foi um ato muito bonito. Me lembro como se fosse hoje. Aí comecei a lecionar oficialmente em 1974 ou 76. Depois, terminei minha jornada de estudos.

RD – E a chegada à Porto Velho?

ZA – Minha mãe faleceu quando eu tinha 20 anos de idade e por isso saí da roça. Vim para cá, fui professor do Colégio Rio Branco; da Escola Petrônio Barcelos, aqui perto, e terminei passando no concurso da Emater [A Empresa Estadual de Assistência Técnica e Extensão Rural do Estado de Rondônia] entre os primeiros colocados. Trabalhei na Emater, fiz vestibular em 81, passei, me formei bacharel em Economia e permaneci fazendo trabalhos sociais. Em Porto Velho, lá por 1986, acabei como presidente de uma associação de moradores. Aqui, onde funciona a Associação Beneficente Zequinha Araújo, nós colocamos uma salinha quatro por quatro. E começamos a fazer trabalhos comunitários.

RD – Iniciou-se, então, uma carreira política inconscientemente?

ZA – É, mas sem intenção num primeiro momento. Em 89, 90... O governador Jerônimo Santana havia planejado um loteamento no que você conhece hoje como Bairro Jardim Satana. Ele já estava saindo do governo e queria entregar os lotes. Nem entregar tinha entregado, mas ele queria fazer essa entrega de lotes. Lá havia sido planejada a entrega de casas. Já haviam sido compradas algumas coisas, como telhas, vinte mil telhas compradas, e aí eu fui chamado. “Olha, você quer tentar esse desafio aí? Já está tudo jogado mesmo...”. Aí eu fui como uma espécie de “bucha de canhão”.

RD – Sua intervenção deu resultado?

ZA – Comecei a fazer o loteamento, sem carro, sem condição alguma. Mesmo assim, conversando com o pessoal, consegui fazer praticamente sozinho o loteamento, que hoje é chamado Jardim Santana, um bairro de Porto Velho.

RD – Abriu alas para a carreira eletiva?

ZA – Em 91, houve a eleição para vereador. Me chamaram para tentar e eu resisti: “Não, não quero. Não sei nem pra onde vai esse negócio de política”. E eles: “Não, você será o nosso vereador”. Eu insistia: “Não, não quero. Não tenho condições. Tenho só uma bicicleta”. Mas bateram o pé e disseram que eu seria candidato mesmo que perdesse. “Se perder, perdeu. Mas nós vamos votar em você”. Então tinha feito o loteamento, havia já o Bairro Nova Porto Velho, eu era presidente da associação de moradores e fiz campanha em dois bairros. Tanto lá no Jardim Santana, quanto aqui no Nova Porto Velho.  Eu pegava a bicicleta cedinho e ia pra lá, trabalhava com eles, chegava à noite no Nova Porto Velho, conversávamos em reuniões. Fizemos muitas mobilizações também. Aí depois que o Jerônimo Santana saiu do mandato fiquei meio ‘avoado’, não tinha amparo.

RD – Avoado em que sentido?

ZA – Porque a oposição batia muito dizendo que ele havia feito o loteamento errado e coisas do tipo. E aí o pessoal não quis dar muita atenção a nós. Tivemos de fazer um trabalho de participação popular. Chegamos a invadir a Ceron algumas vezes, com duzentas a trezentas pessoas, para que a energia chegasse ao loteamento. Invadimos a Secretaria de Educação para que as escolas chegassem ao Bairro Ulysses Guimarães, algo que hoje é uma realidade. Até naquela época, que havia a Teleron, nós a invadimos para poder levar um 'orelhão' para lá. Lá era muito distante, naquela época o Jardim Santana ficava isolado.



RD – E quem o lançou de fato na política?

ZA – Olha... Nós fomos conquistando espaço e abrindo os caminhos através de várias lutas e batalhas. Terminei aceitando o convite para ser candidato a vereador. E, à ocasião, o então prefeito José Guedes (PSDB) me chamou e disse: “Não tem essa, você vai ser candidato! Mas pra você ser o nosso candidato terá de passar por uma prévia”. Os outros candidatos, me recordo, já tinham vaga garantida. O Guedes foi pontual: “Você terá de passar por uma prévia. Há 80 pessoas querendo se candidatar. Tem oito vagas separadas pra vocês. Vocês vão disputar!”.

RD – O senhor pertencia a qual partido?

ZA – PSDB.

RD – Foi o primeiro partido?

ZA – Não. O meu primeiro partido foi o PT. Naquela época eu era petista mesmo, barbudo e tudo [risos].

RD – E aí mudou radicalmente...

ZA – Foi, foi... Fui para o outro lado, sim. Em função da intervenção do Guedes, que era muito amigo da gente. Por isso passei para o PSDB e fomos trabalhar.

RD – Voltando à prévia...

ZA – Sim, então ele disse que eu teria de participar da prévia. Fui para a prévia e fiquei em segundo lugar. O Guedes, então, falou: “Rapaz, você é bom. Dá de você ser candidato, pelo menos pra ajudar os outros”.

RD – Foi para a eleição, então?

ZA – Havia vereador com carreira sólida na política, enfrentei esses nomes, saí eleito desse pleito de uma forma surpreendente. Me recordo que o Dr. Mauro [Nazif, ex-prefeito de Porto Velho] fez mil e oitenta votos; o Eliseu da Silva uns mil e pouco e acabaram me puxando por conta do peso da legenda, o quociente eleitoral. Eu fiz 473 votos.

RD – Eleito pela primeira vez?

ZA – Primeira vez! Em 1992. E realmente fiz a campanha com auxílio de uma única bicicleta. Nova Porto Velho e Jardim Santana, meu amigo. Esses dois bairros, apenas. Não quis ir a outro lugar, eu não tinha conhecimento. Eu trabalhei dessa forma, ganhei a eleição pela primeira vez e aí veio a segunda eleição, a terceira, a quarta, a quinta...

RD – Veio, então, a candidatura a deputado estadual...

ZA – Isso, vim pra deputado estadual e fui um dos mais votados, na verdade, o segundo mais votado. Fiz vinte mil e novecentos votos. Depois fiz besteira.



RD – Que tipo de besteira?

ZA – Fiz dezenove mil e novecentos votos em Porto Velho, os outros mil fora. Quando assumi, quis ajudar o interior achando que a Capital estava bem resguardada. Na campanha à reeleição, Porto Velho me deu cinco mil e poucos votos. Saí de dezenove para cinco mil. E no interior, onde investi, ganhei os mesmos mil votos. Perdi a eleição, recuei.

RD – Como foi sentir, pela primeira vez, o gosto da derrota?

ZA – Foi bom por um lado. Foi bom porque a gente aprende apanhando também. Me recuperei agora, graças a Deus, fiz três mil e tantos votos para vereador, o quarto [na verdade, foi o quinto] mais votado. E enfrentei a campanha novamente na pindaíba.

RD – Como assim na pindaíba, vereador?

ZA – Quando saí da Assembleia Legislativa (ALE/RO) fiquei sem mandato e o governador não me deu condição alguma para trabalhar. Fiquei sem alternativa, somente com a associação. Fui pra cima, me recuperei. Fiz uma campanha gastando em torno de R$ 25 mil, mas graças a Deus os votos vieram e a gente está trabalhando mais do que nunca fazendo serviço social. Eu sempre digo: isso não é um trabalho, é uma missão! Quando você faz algo sem pensar no dinheiro está praticando uma missão. Aqui a gente não pensa em ganhar muito, ser milionário ou coisa parecida. Senão já era! Porque trabalho aqui há mais de 25 anos. Aqui nós temos uma satisfação muito grande em ajudar as pessoas. Se a pessoa sai feliz, nós ficamos também.



RD – Qual a estrutura de atendimento da associação?

ZA – Nós temos mais de 500 médicos atendendo. Só aqui na associação são 70 em três unidades. Fora daqui nós temos convênio com qualquer hospital particular, clínicas. Em Ji-Paraná, Ouro Preto, Jaru, Vilhena, então onde você vai é provável que exista uma célula da Associação Zequinha Araújo e pessoas credenciadas.

RD – O senhor tem ideia do número de associados?

ZA – Acima de 20 mil. Mas há os que passaram e não renovaram. Porque é assim: você faz a carteirinha e ela é válida por um ano. Se você renovar, tudo bem. Se não renovar, fica extinta. Muita gente passou por aqui, se associou, mas não renovou. Se levarmos isso em consideração, chegaríamos a um número de associados maior do que 50 mil. A média de atendimento hoje aqui é de 10 mil pessoas ao mês.

RD – E quantas pessoas trabalham pela associação?

ZA – Mais de cinquenta pessoas, todas com carteira assinada fazendo trabalho social com a gente. Aqui, em Guajará, Candeias do Jamari, Nova Mamoré, onde temos uma unidade pequena também, e estamos expandindo.

RD – Não parou por aí?

ZA – Não parou. A associação existia em Cacoal, Buritis e outros locais. Tive de parar quando perdi a reeleição a deputado. Porque não deu pra continuar, não havia condições financeiras nem de deslocamento. Muita gente saiu perdendo. Hoje o povo desses locais solicita muito: “E aí, quando é que vai voltar?”. E eu: “Ah, não dá mais... Fica difícil agora. Tenho de ficar em Porto Velho mesmo”.





RD – O senhor ainda está se recompondo do baque de 2014?

ZA – Sim, me recompondo até politicamente. Meu interesse hoje é outro. A política, para mim, é um instrumento para contribuir com o meu trabalho. Meu trabalho principal não é a política. Meu trabalho principal é o social. Eu utilizo a política como um instrumento para me dar embasamento, autoridade de me impor em algum lugar, defender as pessoas. É isso.

RD – Mas há quem pense o contrário: que o senhor utiliza a associação para se beneficiar politicamente...

ZA – É... Mas as pessoas entendam como quiserem entender. O importante é o sentimento da gente, isso é que manda. Eu não ligo muito para críticas. As pessoas veem me falar: “Ah, estão falando mal de você!”. Eu sempre respondo: “Deixa falar, não tem problema”. Eu fazendo meu trabalho e as pessoas estando felizes está tudo certo. Fiz uma Casa de Apoio aqui que, com dez reais, você dorme lá, toma café da manhã. Quantas pessoas que vêm de fora e não têm onde ficar e nem condições de arranjar um local decente? Essas pessoas vêm do interior, de distritos de Porto Velho. Elas chegam aqui e não têm onde ficar. Vão ficar na Rodoviária? Não, meu irmão. Elas vêm para a Casa de Apoio. Algumas falam: “Eu não tenho dez reais”. Eu rebato: “Então vai lavar os pratos, pronto. Resolvido”.



RD – O senhor não se vê, então, como um político assistencialista?

ZA – Não. Não, porque aqui nada é de graça. A gente constituiu um trabalho onde as pessoas têm dignidade. Ninguém está fazendo favor aqui. Todo mundo que vem aqui paga a sua carteirinha, as consultas são baratas, mas são pagas também. A gente só deu condições para que as pessoas tenham uma opção a mais em suas vidas. Não oferecemos nada gratuitamente. “Pega aqui, toma uma consulta. Pega isso, pega aquilo”. Não, nada disso. Isso é assistencialismo, quando é tudo grátis. Aqui nada é grátis.

RD – Mas dá voto, não dá?

ZA – O que eu sei é que as pessoas têm a oportunidade de ter um serviço mais barato à disposição, apenas isso. É isso que faço hoje não como vereador, mas como pessoa que, graças a Deus, teve o pensamento de fazer esse trabalho. Porque é difícil, há muitas limitações. Nós sabemos. Há muitas pessoas tentando imitar, fazer igual. Mas isso não é feito num estalar de dedos. Isso é construído ao longo do tempo. Então, com 27 anos, a gente conseguiu fazer um trabalho com mais determinação. Ficou mais sólido, não dá de você derrubar assim de um dia para o outro. Você viu aí fora como tem carros para tudo quanto é lado, de todos os tipos. Comecei um trabalho pensando que seria voltado só às pessoas mais carentes, pobres. Sempre pensei em ajudar as pessoas que precisam.

RD – Os ricos também usufruem da associação?

ZA – Hoje, há fazendeiros chegando aqui; donos de loja; engenheiros fazendo carteirinha e por aí vai. Por quê? Porque criei uma condição maior. Se você quer cursar uma faculdade, tem 20, 30% de desconto. Se você for na Fimca, na Uniron, na Fatec, na São Lucas, onde for, tem desconto! Quer colocar a criança na creche? Tem desconto! Quer ajeitar seu carro? Tem 20% de desconto na oficina! Quer comprar material de construção? Tem 20% de desconto. Quer treinar na academia? Tem 30% de desconto! Comprar remédio? 20 a 30% de desconto! Fazer óculos, pode ser Ray-Ban, pode ser de sol, do que for, de quaisquer lentes, de grau, enfim, tem 30% de desconto! Em qualquer lugar que você vá com essa carteirinha há desconto e não precisa vir aqui pegar autorização e voltar ao comércio. A carteirinha te dá, imediatamente, o status de associado concedendo direito a tudo isso. Hoje nós atendemos muita gente nos hospitais particulares.



RD – Fora de Rondônia também?

ZA – Se você for a um hospital português em Recife será atendido porque há convênio. Se você for à Apuí, 600 km daqui, nós temos convênio. Se você for à Rio Branco, no Acre, tem mais de 40 médicos atendendo. Então eu me sinto realizado com o que Deus me ofereceu. Porque esse sistema da carteirinha, lembro, foi um "toque" dado por Deus. Eu estava acordado em determinado dia lá pelas 05h, e sempre acordo muito cedo. Umas 05h30 costumo fazer uma caminhada pra poder sair tranquilo. Tive um estalo pouco antes de sair enquanto escovava os dentes, do nada, e resolvi implementar isso na associação. “Ajeita umas carteirinhas lá que vai dar certo”, parece que alguém estava dizendo para mim. E eu comecei sem ninguém acreditar.

RD – A adesão foi grande logo no começo?

ZA – Que nada... No primeiro ano, quase ninguém fez a carteirinha [risos]. Umas 300 pessoas fizeram durante um ano, no primeiro ano, pouquíssimas. No ano seguinte, duas mil pessoas. E começou a engatar, melhorando no terceiro, no quarto e aí por diante. Começamos a expandir. Tem gente que vem de Vilhena fazer a carteirinha porque sabe, por exemplo, que uma ressonância magnética que custa cerca de R$ 1,6 mil com a carteirinha será realizada por R$ 560,00; uma tomografia de R$ 800 é feita por R$ 260; o exame de fezes custa, com a carteira, R$ 5,00; um hemograma é R$ 10,00; tem aparelho ortodôntico grátis com manutenção por R$ 50,00. Tudo através dessa carteirinha, então é um negócio simples, muito simples. Mas tem de ter persistência, ousadia. Tem de ser arrojado. Tem de ter tudo isso. “Ah, mas eu não estou ganhando dinheiro e vou acabar com tudo isso”. Se fosse fácil, já teria um senador Fulano de Tal, deputado federal e tantos outros políticos fazendo a mesma coisa. Graças a Deus a gente está aqui. Por quê? Porque a gente gosta de fazer. Eu gosto de fazer, não espero por ninguém. Não sou uma pessoa que tem vergonha. Não sou vereador de andar de paletó, nariz empinado e coisa e tal.

RD – Como o senhor é no dia a dia?

ZA – Sou simples. Hoje de manhã eu estava num posto de saúde fiscalizando como está a situação. Aproveitei, entreguei panfletos da associação, conversei com as pessoas, tomei café. Eu sou desse jeito. Agora, nós temos projetos. Mas os projetos políticos são outra coisa. O social nós vamos levando desse jeito. Por exemplo, domingo agora [foi, na verdade, no dia 28/05], estaremos no Bairro Ulysses Guimarães levando um projeto chamado 'Domingo na Comunidade'. Projeto que nós levamos tudo o que é da associação gratuitamente. Todo o mês para um bairro diferente. Levamos médicos, dentistas, cabeleireiros, manicure, laboratório, tudo! A gente atente de duas a duas mil e quinhentas pessoas todo o mês. É espontâneo. São pessoas voluntárias que não recebem um só centavo. Por quê? Porque é um trabalho sério e as pessoas se sentem felizes também e agradecidas pela oportunidade de ajudar.



RD – O Zequinha Araújo, o campeão de votos, existiria sem a associação?

ZA – Eu acho que não, vou ser bem sincero. Acho que não. Porque a associação beneficia muita gente mesmo. Muita gente sai agradecida pelo o que a gente fez. Agora, na primeira vez que fui eleito eu não tinha associação. Nem na segunda e nem na terceira. Só a partir da quarta vez para frente. Quando iniciei os trabalhos na associação fiz minhas campanhas expondo serviços prestados à sociedade, demonstrando minha garra. Hoje eu tenho muito voto por conta da minha determinação, pela minha raça, mas principalmente por conta da minha humildade. Mesmo quando eu era deputado meu gabinete era diferenciado. Eu sou uma pessoa simples. O poder econômico não me subiu à cabeça. Eu faço o que gosto.  



RD – Vereador, em 2011 o senhor foi alvo de uma acusação muito séria referente à Operação Termópilas. A informação revelou que a Polícia Federal o flagrou recebendo propina do então assessor direto do ex-presidente da ALE/RO Valter Araújo, Rafael Santos Costa. Esse dinheiro, segundo consta, teria sido guardado em uma de suas meias. O que tem a dizer sobre isso?

ZA – É... É até uma questão sigilosa solicitada pelo meu advogado, mas não tenho nada a esconder. Aquela situação ali foi colocada. Foi colocada pelo pessoal. Aquele momento foi muito difícil pra mim porque houve uma injustiça grande. O que me fez passar por isso naquele tempo foi uma questão de dívida de campanha. Uma dívida de campanha muito grande, falei inclusive às autoridades do governo. Me falaram: “Não tem problema, temos um resto de campanha e nós vamos conseguir pagar essa dívida”. Não sei como, mas o Valter Araújo ficou sabendo disso. Ele era, ele era não, ele é um adversário meu muito ferrenho porque, ainda na vereança, votei contra ele numa Mesa Diretora formada à época. Ele ficou chateado comigo, enraivecido. Então ele montou uma maneira para descontar. E também tem outro fator...

RD – Qual?

ZA – Eu estava despontado para ser o prefeito de Porto Velho. Se eu fosse candidato na época poderia chegar lá, pois tinha 60% de intenções de voto em pesquisas, estava bem a frente. E o Valter também tinha a vontade de ser prefeito. Então ele tinha de encontrar um jeito de me derrubar.

RD – Mas de que maneira queriam derrubá-lo?

ZA – Fazendo essas gravações. E essas gravações... Aí falam em dinheiro na cueca... Dinheiro na meia [risos]. Falam em corrupção e mais um monte de coisa, mas nunca fui disso não, graças a Deus. O que vão falando, infelizmente, vai ficando. A Polícia Federal tem a obrigação de investigar da melhor maneira possível, mas chegará o momento em que tudo será mostrado às claras, se Deus quiser. Não tenho um pingo de receio. Nunca, graças a Deus, fiz tal crime. Porque isso é crime, né?

RD – É sim, vereador. E grave...

ZA – Tal crime nunca fiz. Nunca foi preciso fazer. Eu não preciso fazer isso pra poder me eleger. Tenho minha maneira de ser. Tanto é verdade que a população sabe da minha postura, da minha conduta e do meu perfil, que acabei me elegendo de novo agora. Você sabe que teve pessoas dessa mesma operação que foram candidatas, várias delas. Nenhuma conseguiu ganhar. Por quê? Porque eu, o vereador Zequinha Araújo, sou transparente. É esse companheiro que está aqui na sua frente, que não tem malícia. Eu não tenho malícia política! E como não tenho essa malícia não detectei que estava sendo enrolado, jogado às traças. Terminei fazendo parte de um momento, de algo que não tinha nada a ver. Entrei de graça naquele negócio, mas o tempo dirá. Vamos esclarecer tudo isso. A população ficará ciente, com certeza, de que eu não me envolvi com isso. Eu não votei no Valter Araújo [à Presidência da ALE/RO] pra você ter ideia. Não tenho uma conversa que seja com ele, você pode procurar. Não tenho uma conversa, a gente não se dava bem. Na ALE/RO, passei quatro anos lá a "pão e água" mesmo, não teve jeito. Eu falo isso abertamente, não tem problema. Pão e água! Eu não votei no grupo dele. Como seria possível eu ter essa integração com o Valter? Jamais! Também nunca desejei mal a ninguém. Pode ser um inimigo meu, mas jamais desejei ou desejarei mal. Que Deus tome providências e o trate da melhor maneira possível. Ele [Valter] precisa neste momento também.  Então, nós estamos aí, continuo o Zequinha Araújo de sempre.

RD – O senhor é inocente, uma pessoa honesta?

ZA – Graças a Deus! Eu não tenho malícia nenhuma, nenhuma! Sou uma pessoa que dorme tranquila. As pessoas às vezes podem dizer que você não presta e coisa e tal, mas a consciência não pesa. Durmo tranquilo.





RD – O senhor relacionou dois assuntos que são ocasiões distintas: o dinheiro na meia, que seria referente à Operação Termópilas, mas também há a denúncia envolvendo propina escondida na cueca, esta ligada a dinheiro supostamente ilícito recebido enquanto vereador à época da gestão Edson Gazoni. Inclusive, neste último caso, a cena fora gravada em vídeo registrando momentos de pulos de alegria e exaltação por conta do embolso. Isso ocorreu mesmo?

ZA – Ocorreu, ocorreu... Aí é o seguinte... Ah, na cueca não... [gargalhada]. Eu coloquei o dinheiro no paletó. Vou falar como foi, você vai entender: naquela época, na gestão do Gazoni na Câmara Municipal, o dinheiro não era depositado no banco. A gente pegava o cheque na Tesouraria.

RD – Mas era dinheiro do quê?

ZA – Do salário.

RD – Em mãos e em dinheiro?

ZA – Não em dinheiro, em cheque. Nós pegávamos o cheque no Departamento Financeiro. A gente pegava o cheque, guardava e pronto, acabou, resolvido. Só que havia um amigo nosso, um companheiro que trabalhava no banco e tinha facilidade em trocar o dinheiro. A gente tinha de ir para a sessão, e a sessão era de manhã, então nós pedimos a ele que fizesse esse favor pra gente [trocar o dinheiro]. Você pode observar no vídeo que não há apenas um vereador. Eram vários que estavam lá no Departamento Financeiro. Aí ligávamos para o nosso amigo do banco e perguntávamos: “Fulano, você pegou o dinheiro?”. E ele: “Peguei!”. “Então passa aqui depois”.

RD – Aí ele voltava com dinheiro vivo e distribuía?

ZA – Sim, ele voltada porque havia trocado o cheque. Era nosso dinheiro, dinheiro do salário. Aí entregava na brincadeira: “É tudo seu”, dava nas mãos de um; “tudo seu”, nas mãos de outro e assim por diante [a cada relato de entrega do dinheiro, bate com o punho cerrado de uma das mãos na outra dando ênfase ao ato]. E de maneira bem espontânea nós pegávamos.



RD – E a euforia?

ZA – Quando peguei o meu salário eu falei: “Eita, que hoje eu tô rico!”. Eu sempre fui muito extrovertido, gosto de brincar e contas piadas. Tirei graça da situação com o dinheiro na mão e depois guardei, mas não na cueca [gargalhada], foi no bolso do paletó. Nunca fiz isso de esconder dinheiro na cueca! Essa foi outra maneira que encontraram para me desestabilizar por ter votado contra a excelência Valter Araújo.

RD – O Valter já era seu inimigo nessa época?

ZA – Não, não... Mas essa história veio à tona depois que passei a ser uma pessoa não grata junto ao Valter. Aí que eles vieram com essas coisas e fizeram até montagens, colocaram só o Zequinha na situação. E havia vários vereadores também, mas os colegas não tinham culpa alguma. Porque era dinheiro deles, dinheiro nosso, do nosso salário! Mas isso veio de maneira desvirtuada, chegou à imprensa, foi pro Ministério Público (MP/RO), voltou para a Câmara para que nós fôssemos cassados, porém provamos que tudo ocorreu legalmente e fomos absolvidos em função  da inocência, da maneira simples como tudo ocorreu. De qualquer maneira atrapalha a gente, o dano causado é irreversível. Agora há pessoas que ficam dizendo: “O Zequinha guarda dinheiro na cueca”. Graças a Deus sou consciente de que meu trabalho é maior do que isso. Minha personalidade e perfil são maiores do que isso. Sou consciente de que não fiz. Se tivesse feito estaria preso. O MP/RO teria dado prosseguimento. Foi tudo demonstrado, a filmagem, dentro daquele contexto inventado, desmentida. Um dia um colega nosso olhou pra cima e disse: “Rapaz, nós estamos sendo filmados”. Eu respondi: “Não, não é não”. Ele enfatizou: “É sim”.

RD – Uma câmera escondida, plantada clandestinamente?

ZA – Sim, arrebentaram o local onde havia desconfiança da implantação dessa câmera. Justamente no local onde recebíamos o salário.  Uma câmera escondida [risos].



RD – Algo premeditado, feito pra comprometer os vereadores?

ZA – Claro, porque sabiam que era ali que a gente recebia. Então o cenário foi forjado para que aparentasse uma situação de recebimento de propina, agravada pela felicidade que nós estávamos por receber um dinheiro que era nosso. Uma brincadeira feita por uma pessoa simples. Isso aconteceu na véspera de eu ser candidato pela quinta vez. Aí veio aquela confusão toda e eu falei: “Tô perdido!”. Aliás, fizeram muitas coisas contra mim.



RD – Que tipo de coisas?

ZA – Aqui mesmo na associação, no meu terceiro mandato, eles botaram a Polícia Federal aqui, aliás, tudo quanto é polícia, polícia de todo o jeito! Porque nós tivemos uma campanha relacionada a problemas de saúde referentes à visão. Então trouxemos 70 optometristas para cá, vindos de São Paulo. Foram dois aviões trazendo o pessoal, tudo motivado por eles mesmos, iniciativa da própria associação de optometristas. Eles vieram pra cá e fizeram um grande trabalho. Atenderam umas mil e oitocentas pessoas. Eles trouxeram óculos deles pra vender também, enfim. E foram embora. Durou só um dia a ação.

RD – Sim, mas qual a irregularidade nisso?

ZA – Ficou um rapaz que se deu muito bem comigo. Ele disse: “Eu vou ficar pra te ajudar. Eu vou ficar”. E ficou. Pediu: “Eu posso vender meus óculos?”. Eu respondi: “Pode”. E fazia consultas, que naquele tempo custavam uns R$ 70, por R$ 5,00. E começou a lotar de gente. Era gente pra tudo quanto é lado, o povo sendo atendido. Mas os oftalmologistas entenderam que eu estava atrapalhando eles.

RD – Então não foi uma denúncia política...

ZA – Não, foram os próprios médicos. Eles procuraram a polícia dizendo que um médico falso estava atendendo na associação. Aí veio todo aquele comboio policial, aquela confusão danada. E tudo isso faltando 15 dias para a eleição. Aí invadiram a associação, levaram o rapaz algemado...

RD – Uma verdadeira ‘bomba’ contra sua candidatura, não?

ZA – Rapaz, só pensei: “Me quebrei! O tiro saiu pela culatra” [risos]. Aí o pessoal dele se movimentou e a Justiça de São Paulo interveio pelo rapaz. Em duas horas ele estava solto de novo, mas o estrago já havia sido feito. Veio a imprensa: rádio, televisão, sites de notícias, todos juntos no 13º Departamento de Polícia. Aí veio, assim como as polícias, todo mundo em comboio pra cima de mim. A ideia deles era chegar de uma vez pensando, provavelmente, “Assim a gente acaba com ele”. Ficaram 43 carros do lado de fora da associação: tinha polícia, jornalista, enfim. E gente filmando, focalizando. Pensei comigo de novo: “Me quebrei mesmo!”. Fui pra eleição e, surpreendentemente, me consagrei como o mais votado até hoje na história de Porto Velho. Ganhei cinco mil votos, arrebentei de votos! Então acabou pra eles [seus detratores]. Por quê? Porque a população percebeu que fui uma vítima por tentar ajudar a sociedade e viver levando porrada por isso. Peguei uma porrada de graça. Peguei porrada por querer ajudar alguém. Fui vítima de alguém que queria se beneficiar com aquilo. 

RD – Tirar o senhor do caminho?

ZA – Sim, me tirar do caminho. Quase que fui preso também! O advogado chegou e, conversando com os envolvidos,  resolvemos. Não fecharam a associação, continuei meu trabalho e no outro pleito fiz aquela votação para deputado estadual, ficando em segundo lugar, como falei há pouco. Aí continuaram com aquela ideia de “Agora a gente derruba ele. Ele não vai se safar. Na hora que ele for candidato a deputado nós vamos perguntar para o povo se ele quer esse sujeito como prefeito”. Era uma armação para me derrubar para não ser prefeito. Quando percebi, a Polícia Federal pegou todo mundo. E pegou essa gravação que estava no cofre, porque foi cofre, foi tudo pra lá. Então é isso: graças a Deus sou tranquilo. Sei que uma gravação como essa que estou fazendo contigo, se você colocar ao pé da letra tudo que está aí, pode me causar problemas.

RD – Por que teria problemas, vereador?

ZA – Porque a gente trabalha com pessoas que têm ódio, raiva, sabe?

RD – Sim...

ZA – E isso pode me trazer até problemas pessoais. Mas é a verdade. E a verdade tem de ser dita.  O cara pode até morrer depois, mas fica a verdade dita e aí então eu morro, não tem problema.

RD – Mas o senhor compreende que um homem público não pode se furtar em dizer a verdade, não é mesmo?

ZA – Não, não pode. Eu não posso. Porque senão eu fico parecendo o vilão, o cara que não teve a coragem de falar a verdade. Já falei sobre algumas coisas com membros da imprensa. Não posso falar tudo, despertar tudo porque até certo ponto é pedido do meu advogado e o respeito também, mas tenho certeza que serei absolvido disso aí em função dessa maneira simplória, sem maldade, sem malícia nas minhas ações. Eu queria acertas as contas.  E depois percebi que fui eu o acertado, pois quiseram me lascar aí, mas graças a Deus está tudo em dia, tudo em paz, tudo bem.





RD – O senhor já apresentou sua versão sobre as acusações de ordem criminal. Mas também houve condenações por improbidade administrativa. Um exemplo, inclusive, envolvendo sentença destacando a contratação de servidor pelo seu gabinete na Câmara, mas que, na realidade, prestava serviços aqui para a associação. Isso acontecia de fato, vereador? Ainda ocorre?

ZA – Não. Aí foi um rapaz, que foi companheiro nosso e até hoje está colocando a situação na Justiça. A gente ainda responde por isso.

RD – Que rapaz, vereador?

ZA – Sobrinho da minha esposa. Minha esposa foi ao Maranhão e, ao chegar lá, percebendo a situação de pobreza da família, recebeu um pedido da mãe desse rapaz para que ela o trouxesse para Rondônia. “Leva, por favor, aqui ele não vai ter futuro nenhum”. E minha esposa: “Tá, tudo bem... A gente vai levar”. Ele tinha uns 13 ou 14 anos de idade. Então ele veio pra cá e foi tratado como um filho. Ele repartiu por uns três meses ou quarto com minha filha, que era recém-nascida, a Roseane, que tinha em torno de um ano, um ano e pouco. Não havia outro quarto. Tinha o meu quarto e o quarto da minha filha.

RD – O que ocorreu depois?

ZA – Pensamos: “E agora, o que a gente faz com esse rapaz?”. E chegamos a um denominador comum: “Ah, ele dorme aqui”. Avisei: “Meu filho, você vai dormir aqui com minha filha”. Ficou e, com três meses, consegui construir um quartinho atrás de casa. Até hoje tem o quartinho que eu fiz pra ele dormir. E ele era um filho e tinha de nos ajudar também. Ele não tinha emprego, não tinha nada. Mas ele já tinha uns 15 anos e havia feito uma parte de Magistério lá no Maranhão. Tinha conhecimento de professor. Nós tínhamos uma creche pequena aqui, com 250 crianças.

RD – E então?

Minha mulher sugeriu: “Vamos colocar ele pra ajudar na creche”. Avisamos: “Vamos colocar você pra ajudar na creche e nós iremos colaborar contigo também, dar um dinheiro pra você comprar suas roupas, tal...”. Ele ficou na creche por um tempo, por um tempo... Uns dois, três, quatro anos ficou na creche. Ele tinha habilidade manual em fazer brinquedinho de papel pras crianças, essas coisas didáticas: papagaio, bandeirinhas de São João, essas coisas. Tudo isso ele fazia e fazia muito bem. Tinha muita habilidade pra isso. E deixamos ele trabalhando lá. Com quatro ou cinco anos que ele estava conosco falei: “Vamos colocá-lo na Câmara?”.

RD – Daí que surgiu o problema?

ZA – Então... O pensamento foi: “Surgiu uma vaga, vamos colocá-lo lá”. Mas aos finais de semana, como ele morava com a gente, havia a necessidade de fazer trabalhos voluntários na creche, onde também continuava a ajudar.  “Vamos pra lá, vamos pra lá. Não quero saber dele dormindo aqui até às 10h. Vamos trabalhar!”. E ele ajudava, trabalhando até com idosos, onde temos um grupo com trezentos e tantos idosos. Ele vinha pra cá trabalhar com a gente voluntariamente. Eu dizia: “Você tem de ajudar sua mãe”, porque ele tratava a minha esposa como mãe. Então ele trabalhava na creche, fazia mingau pros idosos, enfim, esses trabalhos sociais. Tudo isso ele fazia, mas fora do horário de expediente da Câmara: era sábado, domingo e aos feriados. Ele poderia trabalhar à tarde, já que não havia expediente no Legislativo. Raramente nos dias de semana à tarde, quando precisávamos, ele vinha também. E aí eu perdi o mandato.

RD – Qual foi o motivo?

ZA – Infidelidade partidária, mas não houve. Só que mesmo assim perdi o mandato. Recorri em Brasília e, com 49 dias, voltei à Câmara novamente. Mas nesse período, não sei o que houve, se colocaram algo na cabeça dele... Ele disse: “Não sei, mas não quero mais trabalhar com vocês”. Aí criou um “pescoço grosso” e foi embora, não ficou mais com a gente. Desde quando regressei de Brasília ele não queria mais ficar. Com seis meses que ele foi, a gente recebeu uma intimação da Justiça como pagamento por tudo o que fez por ele.



RD – Mais uma injustiça que aconteceu na sua vida?

ZA – [Cabisbaixo, com os olhos marejados, silencia]

RD – O senhor se emociona ao pensar nisso?

ZA – [Silêncio]. Difícil, né? [Leva uma das mãos aos olhos para enxugar as lágrimas].

RD – Compreendo, vereador. O senhor tem o tempo que quiser para se recompor...

[Pausa de um minuto]

RD – Vereador, mudando de assunto, como o senhor vê essa nova composição da Câmara de Porto Velho e de que maneira avalia a gestão do presidente Maurício Carvalho (PSDB)?

ZA – O Maurício é gente boa, um cara legal. Ele tem futuro, conhecimento. Não é um marinheiro de primeira viagem. A irmã dele já é política antiga, o pai dele é tradicional, meu companheiro também, o Aparício Carvalho. Eles têm um traquejo muito grande. E ele não veio pra Câmara como muitas pessoas às vezes pensam: “Será que ele comprou os caras para ser o presidente da Câmara?”. De lá não saiu um centavo. Foi tudo acordo interno, das pessoas e alguns carguinhos que têm lá. Agora, não tinha opção.

RD – Como não? O senhor mesmo poderia ser pela experiência...

ZA – Eu não poderia ser. Tentei ser candidato a presidente, mas percebi que não dava pra mim. Eu não apoiei o atual prefeito Dr. Hildon Chaves (PSDB). Não tinha afinidade com o grupo que estava chegando, não teria muito traquejo para trabalhar, talvez fosse oposição. Eu estava em dúvida. Mas pela conversa de alguns candidatos percebemos que o Maurício era quem tinha uma postura melhor. Então todo mundo foi canalizando as intenções para o lado dele e, quando percebemos, estava formado um grupo, o grupo que o apoiou. Foram 14 vereadores, 15, salvo me engano, e terminou saindo daí. Os outros dois são meus amigos também.  Acho que está indo bem...



RD – Sobre a questão da extinção dos quinquênios, o senhor achou que houve ‘rasteira’ na inclusão ao projeto?

ZA – Aquele quinquênio é uma história... Aquele projeto chegou para nós, assim, faltando meio dia para a gente votar. E, em caráter de urgência, foi questionado aos vereadores e eu votei contra, mas fui voto vencido. A maioria votou a favor para que a votação ocorresse naquele dia e foi para apreciação. Não dava tempo para ler e entender tudo aquilo. Eram trezentas folhas de projeto. Mas o chefe de gabinete [da prefeitura, o advogado Breno Mendes] fez uma versão pra gente e tal, só que não explicou, só falou dos benefícios que vinham. Foi quando aconteceu e acabei votando a favor. E deu esse problema aí que está até hoje, tudo complicado.

RD – O que ocorreu a partir desse episódio?

ZA – Dali pra frente ninguém mais aceitou projeto pra ser votado em caráter de urgência. Agora a gente tem um espaço grande de tempo pra poder avaliar, analisar. Mas espero que tenhamos espaço para amenizar a situação.

RD – De que maneira?

ZA – Por exemplo, todos perdiam a gratificação do quinquênio. Hoje não é assim, já amenizou, é diferente. Só a partir de agora que não há mais a gratificação. Os que gozavam do benefício vão continuar usufruindo, estão com o direito assegurado. Espero que a gente ainda consiga melhorar.



RD – E ainda neste mandato, em quais frentes senhor pretende atuar, que tipo de projeto será apresentado?

ZA –  Estou hoje voltado às classes minoritárias. Por exemplo, os índios, temos um trabalho muito grande e relevante com eles. Eles estão ficando abandonados. Eu também sou índio, né? [risos] Tenho de defender minha classe. Temos um trabalho com as pessoas com deficiência, com necessidades especiais. É um projeto meu, estamos criando um Fundo Municipal do Conselho da Pessoa com Deficiência, que será votado agora. Também trabalhamos diretamente nos bairros, esse é o meu forte. Sempre, constantemente e todos os dias estou nos bairros trabalhando e conversando com a população. Também defendendo, levando demandas e às vezes conversando com o prefeito até mesmo em tom mais forte. Às vezes é necessário. Por isso que estamos aí no dia a dia, nessa sobrevivência do cotidiano da política. Mas sempre sem pensar em jogo errado, em propina, em facilidades. Estou fora de coisa errada porque não preciso disso. Preciso ter uma vida feliz, como tive até hoje. Se quisesse ser rico já estaria milionário através de coisas erradas. Porque tenho 23  anos de política com mandato. Poucos têm isso aqui em Rondônia. Se eu me aproveitasse de mandato em benefício próprio estaria milionário, mas graças a Deus vejo meu lado como ser humano. Depois tenho um enorme temor a Deus e um respeito grande pela minha família. Eu estou tranquilo. Faço minhas orações todos os dias. Gosto de brincadeira, de levar a vida de maneira tranquila, muito aberta. Acho que é por aí. Não quero ser o melhor, mas jamais procurarei ser o pior. Então serei sempre a pessoa humilde, simples, honesta e trabalhadora que sempre fui. Um lutador. Eu saio daqui e vou pra Apuí entregar panfletos mostrando o que a Associação Zequinha Araújo tem a oferecer pra eles. Eu tenho voto em Apuí? Seiscentos quilômetros longe de Porto Velho... Eu não tenho voto em Apuí! Eu vou pra lá porque quero fazer o bem pra minha população. Aqui é lotado de gente de Apuí, de Matupi, de Lábrea, Humaitá, Canutama... Gente, não estou querendo fazer politicagem com isso. Quero fazer o bem para a população. Agora, não me importo se as pessoas vão entender desse jeito ou não. O importante é o que estou fazendo. E Deus vai me ajudando também com muita saúde, muita paz. Estou com 60 anos de idade.

RD – Olha aí, tá bem...

ZA – Sou um moleque ainda [gargalhada].

RD – O senhor será candidato ano que vem?

ZA – Eu espero que sim. Por quê? Porque como deputado eu terei condições melhores de ampliar o trabalho social e chegar a mais pessoas que estão precisando. Tem muita gente que vem aqui chorando praticamente pedindo a associação em Machadinho, por exemplo. Mas não tenho condições de expandir pra lá, não tenho! Mas eu como deputado, quem sabe? Preciso, como falei no começo, dessa autoridade política não para benefício próprio especificamente falando, mas para ajudar as pessoas que precisam. Tenho fé em Deus que posso ser novamente candidato e ganhar a eleição. As pessoa falam: “Mas no PMDB você não ganha, tem cinco deputados e não sei quem mais, vão te jogar pa cima de quinze mil votos...”. Então não serei... Qualquer coisa a gente decide lá pra frente. Quem define é Deus quando chega o momento certo. Ele que irá dizer a mim nas minhas orações.

RD – O senhor ainda pretende ser prefeito de Porto Velho ou mesmo governar o Estado de Rondônia?

ZA – [risos] Isso daí nunca passou pela minha cabeça assim não. Isso seria consequência do que vier pela frente. Preciso pisar no chão e saber o que estou fazendo. Vereador tá bom. Estou fazendo um bom trabalho. Se não der como deputado, então está bom, fico como vereador mesmo. Só preciso de alguma coisa, um salariozinho, por que como é que vou viver sem salário?

RD – A associação não dá dinheiro?

ZA – Tudo que entra aqui é gasto na própria associação. Ainda bem que dá pra gente manter. Porque é complicado para a gente manter aqui 52 funcionários de carteira assinada, que dá mais de R$ 60 mil ao mês só de servidor, energia elétrica de mais de R$ 15 mil, aí vem água, telefone, gasolina, refeição, enfim, um monte de coisa. [risos] Muitas coisas. E você tirar esse valor só das carteirinhas ‘véias’ aí que a gente faz e os 10% que os médicos deixam pra nós é preciso Deus estar no caminho.

RD – O senhor vive só do salário de vereador?

ZA – Só do salário de vereador. Agora tenho 60 anos, né? Graças a Deus. O Temer quer acabar com a aposentadoria, mas eu consegui a minha. Então tenho mais uns dois mil e poucos de aposentadoria e é isso, acabou.



RD – Quando o senhor falou sobre a derrota quando fora candidato à reeleição a deputado mencionou rapidamente que o governador Confúcio Moura (PMDB) não teria o auxiliado, desprestigiando-o naquele hiato entre os dois últimos mandatos. Como ficou a relação entre vocês?

ZA – Está tudo tranquilo. É meu amigo, companheiro. A gente reconhece que para ter prestígio tem de ter mandato, tem de ter o voto das pessoas. E aí eu não tinha os votos e o político vive sempre em função de obter algo em contrapartida. E se não tem nada a oferecer, geralmente você fica à mercê, alheio.

RD – Faltou a mão amiga do governador?

ZA – Faltou, faltou... Eu não vou mentir. Faltou... Porque quando eu era deputado sempre fiz o melhor por ele. Sempre fiz o melhor. Fiquei, até certo ponto, desanimado. Triste... Não guardei rancor porque não guardo rancor de ninguém, nunca. Acho que o governador faz um trabalho bom. Aqui em Porto Velho tenho de parabenizar o governador pelos trabalhos. Tudo aqui necessita de ações grandes, envolvendo muita gente. O Restaurante Popular, na Zona Leste, atende mil e quinhentas pessoas todos os dias com refeições a R$ 1. É uma ajuda muito grande e a gente tem de reconhecer o que é bom. Então parabenizo o governador e, no momento que for preciso a gente ajudar, a gente vai ajudar. Porque não estaremos ajudando a ele, estaremos ajudando a população. Sou assim, não guardo rancor de ninguém. Não reclamo, mas também fico triste quando as pessoas não reconhecem o que a gente faz pela sociedade. Porque hoje, queira ou não, ajudo muito o município, Porto Velho, Rondônia em si. Daqui saem hoje 300 pessoas atendidas. Se saem 300 pessoas atendidas pela Associação Zequinha Araújo, são 300 pessoas que não precisam ser atendidas pelo Estado, deixando vagas em aberto. Isso porque há essa opção de as pessoas chegarem até aqui. A gente faz, estamos trabalhando e iremos continuar.

RD – Para encerrar, o senhor teria algum recado a dar aos seus eleitores e à sociedade em geral de Porto Velho?

ZA – Eu tenho, tenho... Meu recado é simples: continuem acreditando no Zequinha, esse 'caboquinho', amigo da população, amigo da sociedade de Porto Velho e do Estado de Rondônia. Sou amigo e parceiro de quem precisar. Sou uma pessoa simples, sem maldade. Continuo simples e pensando que não preciso de malícia para trabalhar. Preciso de honestidade. Gosto do povo, de fazer o bem. Permanecerei assim, acreditem em mim. Nós estamos juntos, vamos continuar fazendo nosso trabalho. As conversas virão. Muitas conversas virão através de  inimigos políticos que a gente nem conhece, nem sabe de onde vieram e as pessoas metem a porrada, mas a gente vai levando pelo meio fazendo o bem sem saber a quem.

RD – Muito obrigado, vereador.

ZA – Tranquilo, tudo bem.  



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Autor / Fonte: Rondoniadinamica

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